Escrever é a coisa que mais gosto de fazer desde sempre.
Bastava eu chegar na casa do meu pai e ele já sabia: me dava papel e caneta. Era tudo o que eu precisava para entrar no meu mundo particular.
No Ensino Médio, meus colegas sabiam que eu gostava de escrever e que meu sonho era tornar-me um escritor famoso. Sempre lembro de um amigo da época dizendo:
Já pensou, um dia nosso filho chega dizendo que tem que ler um livro para escola e é um livro do Tales?
Aquela possibilidade me divertia porque eu a entendia como real.
A faculdade teve o efeito desgostoso de me fazer parar de escrever. Primeiro semestre, aula de escrita, professor sem tato nem didática. Entre 2004 e 2012, escrevi apenas um conto (meu segundo publicado).
Aproximadamente oito anos e somente um conto.
De lá para cá escrevi muita não ficção. Artigos, monografia, outra monografia, uma dissertação. Meu texto melhorou muito, ainda que sem explorar tanto a inventividade que a literatura oferece. Fui aprendendo a mexer no texto dos outros, a pensar o ato de escrever com o objetivo de ser claro e profundo.
Ainda assim, nada de ficção, só a vontade e a tristeza de um sonho largado.

Foi quando duas coisas mudaram meu caminho.
A primeira delas foi um concurso da Editora Escândalo pedindo contos com temática LGBT que não tratassem sobre amor. Havia tempo para escrever e o tema era bastante afim à minha escrita de não ficção (minha dissertação foi sobre educação e homossexualidade).
Animei, mas não muito. Afinal, havia anos eu não escrevia ficção e isso porque imaginava que não tinha a menor condição de fazer isso direito. Eu estava num ponto em que acreditava não ser capaz de fazer literatura.
A segunda coisa que ajudou a mudar meu caminho também apareceu do nada. Caiu em minhas mãos um livro com temática LGBT e eu o li.
Ele era mal escrito.
Uma história legal, bonita, cheia de acontecimentos, mas mal escrita.
Existem livros que nós gostamos e existem aqueles dos quais desgostamos. Independentemente disso, há livros que são melhor escritos do que outros. Escrever é técnica.
Depois de lê-lo, o pensamento foi inevitável: se aquele escritor podia, eu também poderia. Por causa dele, recomecei a escrever e passei a publicar. A coragem que eu tinha quando criança, aquela ingenuidade que acredito ser necessária aos artistas, havia voltado.
Hoje escrevo com prazer, porque escrever me excita.
Escrevo também com medo, porque escrever é se mostrar aos outros.
Escrever, depois de um hiato de oito anos, tem sabor de a coisa certa.