O machismo está em todo lugar

Assisti hoje a Majorité Opprimée, um curta francês que mostra de forma muito clara as experiências das mulheres que sofrem com o machismo cotidiano da nossa sociedade.

O filme está com áudio em francês e legenda em inglês, mas é possível compreender a sequência de cenas. Em resumo, é um mundo espelhado no qual ao invés das mulheres sofrerem a opressão contínua dos homens, os homens é que são cantados na rua, avaliados por suas roupas e destratados por autoridades que deveriam ajudá-los.

Gosto dessa inversão porque ela causa estranheza. Quando estranhamos, percebemos que algo não é tão normal quanto sempre nos pareceu.

Os velhos argumentos “foi estuprada porque estava sozinha na rua à noite” ou “olha essas roupas, chamando a atenção” aparecem no vídeo e não é possível achar nada menos que ridículo alguém estuprar um cara porque está de bermuda acima dos joelhos. Ainda assim, ouvimos e muitas vezes repetimos o mesmo comentário sobre mulheres e suas saias. A lógica mandou tchauzinho já de longe, né?

machismo é uma das bases da nossa cultura (brasileira, ocidental, contemporânea…). O machismo é a crença que as mulheres são inferiores e devem pertencer ao homem.

O genial Laerte atacando de novo :)
O genial Laerte atacando de novo 🙂

Nascer homem é um privilégio

Quando nasci, meu pênis me trouxe vantagens sociais incríveis. Meu salário será quase sempre maior que o das mulheres com empregos semelhantes, não preciso limpar a casa, posso pegar geral e ser garanhão (não puta) etc.

(Eu abdiquei de alguns desses privilégios por ser gay, o que na mentalidade machista faz com que eu vire o equivalente a uma mulher e só por isso deva ser discriminado/erradicado – o que é mais um exemplo da situação absurda em que vivemos.)

Nascer homem na nossa sociedade contemporânea é um privilégio. Caminho na rua à noite preocupado com assaltos, mas não com alguém me achar gostoso e querer me foder à força.

Justamente por ser um privilégio, é difícil largar o osso. É bom demais ser homem. Sem dúvida eu odiaria ser mulher. Li na Aline Valek que nascer mulher é jogar o jogo da vida no modo Hard. Ela está certa; digo isso da perspectiva de quem joga no Medium (seria Easy se eu fosse heterossexual).

O machismo é um vilão imbatível. A gente vence ele aqui, ele volta ali.

Para ser homem e lutar contra o machismo, preciso abrir mão de alguns benefícios que a sociedade sempre me trouxe de bandeja. A Lola, minha blogueira feminista favorita da vida, fez um post ótimo elencando os privilégios que homens têm (a maioria deles invisíveis até que os percebemos pela primeira vez; de novo a coisa do estranhamento).

O machismo está em todos os lugares. Ele é poderoso porque é invisível. Perceber as formas como somos privilegiados pode ajudar nós homens a descermos do pedestal. Não apenas não é fácil como dá trabalho lutar pela igualdade. Não basta balançar uma bandeira feminista enquanto a mulher lava a louça. Não adianta dizer “eu vou te ajudar a lavar a louça”, isso só sugere que o dever de lavar a louça é da mulher e que o homem querido vai contribuir, diminuir o fardo.

Igualdade é outra coisa.

Igualdade implica em abrir mão das vantagens que temos para que possamos igualar o jogo.

E não é fácil. É muito, muito mais fácil ficar jogado na rede enquanto a mãe e a tia lavam a louça, passam vassoura na casa, preparam a comida, lavam roupa. Eu, sem dúvida nenhuma, sou culpado de abusar dessas folgas. Só perceber não me faz uma pessoa melhor.

Saber e não agir é o mesmo que nada.